A Epístola aos Hebreus (Hb) é o décimo nono livro do Novo Testamento e o 58º livro da Bíblia. Possui 13 capítulos e 303 versículos. O livro cobre 52 tópicos proféticos, em 137 versículos, ou 45%. Contém 39 citações diretas do Antigo Testamento.
== Autor e Data ==
Hebreus não designa seu autor, e não houve unanimidade na tradição em relação à essa identidade. Muitos estudiosos procuraram evidências que poderiam indicar uma
autoria paulina, enquanto outros sugerem um dos colaboradores de Paulo como autor do livro. Entre os nomes apontados estão Barnabé (sugestão de Tertuliano), Apolo (sugestão de Lutero),
Lucas (sugestão de Clemente de Alexandria), Clemente de Roma, Epafras, Silas, Priscila, entre outras hipóteses. Por isso, só se pode concordar com Orígenes, no séc. III, ao concluir que só Deus sabe com certeza quem escreveu este livro.
A opinião mais geral, do apóstolo Paulo como autor, enfrenta diversas barreiras. Caso
Paulo tenha escrito aos Hebreus, ele contrariou o padrão das suas
epístolas, por não incluir sua saudação e nome. A teologia, a linguagem e o estilo também são bem diferentes das
cartas paulinas.
O certo é que o autor era bastante instruído na Septuaginta (versão do AT em fala grega) e nos costumes e interpretação judaicas, familiarizado com seu público, era capaz de escrever num grego excelente (há cerca de 150 palavras gregas usadas somente em Hebreus), se reconhece como cristão de segunda geração (2.3) e amigo de Timóteo (13.23).
A aceitação de Hebreus como canônica também não foi geral, e parte disso deveu-se ao anonimato do autor. Mas, desde o século II, diversos autores já negavam a autoria paulina. Alguns, na igreja oriental, justificavam que Paulo escrevera anonimamente, ou que escrevera em hebraico e foi traduzido por Lucas para o grego, ou ainda que os pensamentos eram do apóstolo, mas a autoria de outra pessoa. Contudo, as igrejas das duas partes do Império reconheciam o valor da carta. A inclusão de Hebreus em um corpus paulino data do século V, e as discussões sobre sua autoria foram paralisadas, até renascer com os reformadores protestantes.
Se não temos certeza acerca do autor da carta, também há dúvidas acerca do destinatário. Jerusalém, Cesareia, Antioquia da Síria, Éfeso, Alexandria e Roma são lugares sugeridos pelos estudiosos. O título “Aos Hebreus” não faz parte do texto grego, e supõe-se que o título foi acrescentado para distingui-lo de outros textos que foram aceitos, lidos e discutidos pelas igrejas. Portanto, é de valor questionável, mas, escritores antigos e estudiosos modernos realmente acreditam que
a carta foi escrita a convertidos judeus, da dispersão, de fala grega, que utilizavam a Septuaginta. Colabora também a ausência de referências ao paganismo.
A saudação dos
da Itália (13.24) pode indicar que essas pessoas estavam enviando saudações à sua terra natal. Caso essa seja a interpretação correta, isso significaria que os recebedores da epístola foram uma seção judaica da comunidade cristã de Roma, que é a interpretação mais comum e aceita. É também significativo que a citação mais antiga conhecida de Hebreus ocorra em uma carta de Clemente de Roma no fim do século I.
Pela carta, supomos que seus destinatários já eram crentes há muitos anos (5.12, 10.32), e tinham ouvido de Jesus a partir de outros (2.3,4). Esses interlocutores não apenas conheciam o
Antigo Testamento, mas também a filosofia platônica, visto que o autor usa ideias parecidas (9.24; 10.1), típico da escola alexandrina, que procurou conciliar as escrituras com a filosofia.
Eles também já haviam sofrido perseguição (10.32-34), mas não ainda o martírio (12.4). Tinham sido generosos, cuidando daqueles que sofreram mais (6.10; 10.34). Tiveram grandes líderes (13.7), provavelmente já falecidos, mas não haviam progredido na fé cristã; inclusive parece que alguns estavam se separando da comunidade (10.25).
A maioria dos cristãos primitivos eram judeus, que acreditavam que Cristo voltaria logo; mas a demora de sua vinda e as perseguições contra eles fizeram com que eles questionassem se tinham feito a escolha certa. Ainda haviam os inúmeros pregadores judaizantes, combatidos por Paulo, que diminuíam o Evangelho diante da Lei.
Então, o propósito desta epístola era reafirmar aos cristãos de origem judaica que sua fé no Messias Jesus estava baseada nas profecias, tipos e figuras do
Antigo Testamento que Jesus cumprira. Esses irmãos hesitantes foram estimulados a manter-se firmes na fé.
O conteúdo do livro indica que Hebreus foi escrito antes da destruição do Templo em 70 d.C., ao falar dos sacrifícios em Jerusalém (por exemplo, 8.4), e sabendo também que um evento cumpridor de profecias tão importante assim não passaria em branco. Outro indicativo seria a data das perseguições (10.32-34; 12.4): a perseguição dos primeiros dias poderia ser a de 49 d.C., quando Cláudio expulsou todos os judeus de Roma, quando houve também confisco de propriedades e mau tratamento de cristãos judeus, mas não perseguição até a morte; a perseguição que levaria ao derramar de sangue, considerando os cristãos-judeus em Roma, começaria em 64 d.C., o após o incêndio de Roma, quando Nero iniciou uma intensa perseguição. Assim, muito provavelmente,
a epístola foi escrita nos primeiros anos década de 60 d.C.== Algo de Hebreus ==
A Epístola aos Hebreus é reconhecida como diferente dos demais livros do
Novo Testamento: “Ela começa como um tratado, continua como um sermão e conclui como uma carta” (A.T. Robertson).
Os crentes destinatários de Aos Hebreus passavam por dúvidas. Não ganharam nada de terreno com a conversão, nem mesmo tinham um espaço físico para a religião. Precisavam se reunir em casas e muitas vezes fugir da perseguição. O Messias, sofredor e crucificado, era rejeitado por seu povo, os mortos na fé aumentavam, e a promessa da volta do Messias parecia distante. Assim, compreendia-se a tentação de renegar a Jesus como o Messias e retornar aos bens visíveis e preferíveis, que o judaísmo oferecia-lhes.
Por isso,
uma palavra importante da epístola é “melhor”, usada para descrever ao Messias Jesus e os benefícios do Evangelho (1.4; 7.19,22; 8.6; 9.23; 10.34; 11.16,35,40). A condição espiritual dos ouvintes é mais importante que sua localização geográfica para essa carta: o escritor contrasta o estado em que seus leitores se encontram com o estado em que estavam anteriormente, com o em que deveriam estar, e com o estado em que pareciam estar no perigo de cair.
A primeira parte de Hebreus (1-10) usa 102 referências veterotestamentárias para fazer grandes comparações entre Cristo e os agentes da revelação divina (profetas e anjos) e os agentes de redenção (Moisés e Arão), ressaltando
a superioridade esmagadora do Cristo sobre tudo o que eles tinham vivido sob a Lei. Segundo o autor da carta, a maioria das bênçãos do judaísmo relacionava-se com as coisas terrenas: um tabernáculo ou templo terreno, sacerdotes terrenos, sacrifícios terrenos, um acordo que prometia a prosperidade terrena. Em contraste, o Cristo está à destra da Majestade, nas alturas (1.3), onde distribui as bênçãos celestes (3.1; 6.4; 8.5; 11.16; 12.22-23). Assim, o que é oferecido através do Cristo é muito melhor do que é prometido pela glória terrena vista no templo e sacrifícios; eles não deveriam pensar em voltar.
Um ponto importante desta epístola é a apresentação do ministério sumo sacerdotal de Jesus. Ele é o sumo Sacerdote, não segundo a ordem de Arão, mas sim de Melquisedeque, que não tinha antecessores nem sucessores no sacerdócio. Sendo assim, Melquisedeque era um tipo perfeito para o Cristo, sumo sacerdote por invocação direta de Deus, e não por herança (5.5-6). Seu sacerdócio é eterno, prenunciado em
Gn 14.17-20 e profetizado em
Sl 110.1-4.
Enquanto o sacerdote aarônico tinha que oferecer sacrifícios continuamente por seus próprios pecados e pelos pecados de outras pessoas,
Jesus o Cristo ofereceu de uma vez por todas a si mesmo sem pecados como o sacrifício perfeito. Jesus também experimentou na carne a provação que todos os crentes conhecem, e por isso ele é capaz de interceder compassivamente em nome deles.
A cristologia em Hebreus, cujo tema central é o sumo sacerdócio de Jesus, é uma das diferenças significativas das cartas paulinas. Enquanto o ponto de vista do autor de Hebreus sobre a lei é referente aos rituais, Paulo a viu em seu uso ético, por mostrar o que o pecado é. Mas, ambos ressaltam seu caráter elementar (
Gl 4.13; Hb 7.19), e que Cristo é o fim da lei (
Rm 10.4; Hb 10.4-7). As referências a Jesus Cristo não se encaixam no padrão normal de Paulo, enquanto alguns dos termos usados em Hebreus (Sumo Sacerdote, Autor e Consumador da Fé, Precursor, Autor da Salvação, etc.) não se encontram nos escritos de Paulo.
Apesar das muitas diferenças, há semelhanças impressionantes na teologia de Paulo e Hebreus: a glória preexistente de Cristo e como agente da criação; a obediência e humildade de Jesus; sua oferta de si mesmo; sobre o novo concerto; o exemplo da fé de Abraão; sobre os dons e sua administração pelo Espírito Santo; o uso de mesmas passagens do Velho Testamento; a mesma metáfora atlética. A epístola também se encerra no estilo normal paulino. Com estas semelhanças, leva-se a reconhecer que mesmo descartado a autoria paulina, há alguma ligação entre esta carta e Paulo, fato reconhecido desde a antiguidade e registrado por Orígenes.
Um destaque também pode ser dado ao que o autor da epístola chama de ensinos fundamentais (6.1-2): o arrependimento de atos que conduzem à morte, a fé em Deus, a instrução a respeito de batismos, a imposição de mãos, a ressurreição dos mortos e o juízo eterno.
O cap. 11 enumera alguns dos grandes heróis da fé no
Antigo Testamento. Os vs. 4-35 registram bênçãos maravilhosas e notáveis vitórias alcançadas através da fé, enquanto os vs. 36-38 registram aqueles que resistiram a grandes provas, sofrimento e perseguição através da fé. Significativamente, não há menção dos pecados e defeitos daqueles enumerados. Seria um paralelo com o sangue de Jesus que risca os pecados e fracassos?
Passagens lidando com eventos futuros são encontradas em versículos como 9.27,18, 10.14-18,37, 12.25-29, 13.8, esta última indicando uma das declarações mais fortes do cristianismo:
Jesus é o mesmo ontem, e hoje, e eternamente.
Hebreus se aproveita à exaustão do Antigo Testamento, revelando que uma compreensão total do AT fornece uma apreciação da graça de Deus através do Messias. Visto que os destinatários, nascidos judeus, liam as escrituras e reconheciam sua autoridade divina, o argumento do autor em favor da superioridade do Messias sobre os anjos, sobre o sacerdócio levítico, sobre os sacrifícios, é o testemunho profético do próprio
Antigo Testamento. Obviamente, apenas gentios convertidos aceitavam o Antigo Testamento, e não tinha nenhum interesse para um gentio que deixasse o cristianismo; apenas a um cristão judeu poder-se-ia fazer apelo à autoridade da revelação do Velho Testamento para comprovar a revelação de Jesus.
Nesta carta, o cristianismo é exclusivamente colocado em contraposição à religião judaica. Nada há acerca das religiões pagãs.Apesar de a epístola ser primariamente doutrinária, também é intensamente prática. Depois de cada passagem doutrinal, o escritor insere seções com conselhos bastante precisos com base nos ensinamentos apresentados. Ele usa pelo menos quinze vezes o imperativo afirmativo (4.1,11,14,16; 6.1; 10.22,23,24; 12.1,2,28; 13.1,5,13,15,17).
Embora Hebreus seja especificamente dirigido aos judeus cristãos, seus ensinamentos e conselhos práticos são também aplicáveis aos gentios crentes. Em Cristo, não existe distinção entre judeu e gentio.
Percebamos que o autor torna seus leitores conscientes, a saber: da revelação e salvação dada por Deus; do caráter celestial e eterno das bênçãos recebidas pela fé; do sofrimento e da persistência no caminho terreno até o alvo do propósito de Deus; do terrível julgamento aos que conheceram tudo isso e rejeitaram tal revelação em Cristo. Após isso, o escritor os impele a agir conforme esse conhecimento. Para o autor de Hebreus, e para as demais epístolas, tão importante quanto a doutrina correta, é a vida correta, e por isso o livro é
uma exortação à maturidade cristã.
Essa é também a mensagem de Hebreus para o cristão moderno. Aos Hebreus foi escrita para cristãos que estavam num estado de crescimento impedido (5.11-6.3); permaneciam como crianças espirituais. Os cristãos precisam crescer na vida espiritual, como as crianças normais o fazem na vida física; esse é o caminho natural.
É perigoso permanecer sempre uma criança.Mas, tão perigoso quanto, é crescer fora de Jesus Cristo: o crescimento deve ocorrer n’Ele; tudo o que se precisa para o crescimento encontra-se no Senhor e Salvador. Assim, o crescimento ocorre à medida que os olhos da pessoa estejam centralizados em Jesus (12.2) e a vida seja rendida completamente a ele, em fé. É em Jesus que podemos ser aperfeiçoados, em tudo o que é necessário, para nosso crescimento até a maturidade espiritual.
Para encerrar,
o ministério do Espírito Santo é visto de diversas maneiras, aplicando-se tanto ao período do AT quanto do NT: os dons do Espírito para o ministério (2.4); testemunho à inspiração do AT (3.7; 10.15); descrição da experiência dos crentes (6.4); interpretação da verdade espiritual (9.8); assistência no ministério de Jesus (9.14); insultado pela apostasia (10.29).
Fontes:– Bíblia de Estudo Plenitude, editor-geral Jack Hayford, Sociedade Bíblica do Brasil;
– Bíblia de Estudo Profética de Tim LaHaye, Editora Hagnos;
– O Novo Comentário da Bíblia, F. Davidson, Editora Vida Nova;
– Introdução ao Novo Testamento, Broadus David Hale, JUERP;
– Bíblia de Estudo Arqueológica NVI, Editora Vida.
Esse pretenso estudo é apenas um resumo a partir de textos lidos, e, às vezes, algumas considerações minhas. Contudo, apesar de apresentar algumas ideias comuns a muitas correntes, vale lembrar que representa apenas uma pequena parte do grande universo de estudos bíblicos, com suas diversas interpretações do que concebemos como revelação e da diversidade de correntes cristãs.
Ainda reitero que em algum momento esse pequeno texto será revisado, e alterado, a depender do meu tempo e vontade.
Nenhum comentário:
Postar um comentário